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Por mais mulheres à frente dos tribunais de contas
* Por Rayane Vieira Rodrigues, Maria Alice Pinheiro Nogueira Gomes e Marco Antonio Carvalho Teixeira
Na última quinta-feira (2), a Câmara votou e escolheu majoritariamente o deputado Jhonatan de Jesus (Republicanos-RR) para ocupar a vaga de Ana Arraes, que se aposentou em julho de 2022, como ministro do Tribunal de Contas da União (TCU). A candidatura de Jesus contou com o apoio do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e de um arco partidário que foi do PT ao PP, num claro processo de barganha política. Agora cabe ao Senado sabatinar o nome indicado pela Câmara e se posicionar sobre sua aprovação. Ainda há espaço, portanto, para a reversão dessa indicação.
Importante lembrar que Ana Arraes foi apenas a segunda mulher em 130 anos de existência do TCU a fazer parte do corpo dirigente do órgão. Apesar de o deputado escolhido apresentar um perfil adequado às exigências legais para ocupar o cargo, é importante lembrar que as instituições democráticas precisam considerar o equilíbrio de gênero como forma de democratizar suas gestões. A Câmara, ao desconsiderar isso, sinaliza um enorme retrocesso civilizatório, contradizendo o passado de avanços e apoio a uma democracia mais inclusiva.
Contradiz, ainda, um dos maiores legados de Ana Arraes à frente da presidência do TCU (2020-2022): a aprovação do Plano de Logística Sustentável (2021-2025), fundamentado nos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da Agenda 2030 da ONU, que prevê, dentre tantas outras ações, a promoção da igualdade de oportunidades para mulheres no ambiente de trabalho daquele tribunal. Como resultado, a participação feminina em cargos dirigentes do TCU passou de 12% para 30% na gestão de Ana Arraes.
Ademais, a questão que se coloca é que as vagas de cargos importantes, como ministro do TCU, do Supremo Tribunal Federal e da Procuradoria-Geral da República, entre outras, não devem ser alvo de barganha para a governabilidade. Caso essa prática se mantenha, além de dominar o Congresso, o centrão dominará também, por longo prazo, essas instituições que acumulam prerrogativas e poderes políticos de grande importância na Federação.
O mais preocupante é que isso não é exclusividade do TCU. Após pesquisarmos as informações sobre a dimensão de gênero nos sites institucionais dos 33 tribunais de contas, chegamos ao seguinte retrato: do universo de 231 dirigentes, apenas 26 são mulheres, o que representa somente 11,2%. Nenhum tribunal da região Sul possui mulheres no seu colegiado. No Sudeste, apenas os tribunais estaduais de São Paulo e Rio de Janeiro contam com uma mulher como titular em seus conselhos. A melhor representação feminina encontra-se na região Nordeste, com 12 conselheiras (17,14% do universo de 70 da região), destacando-se o TCE-PI, com três, seguido do TCE-CE, TCE-AL e TCE-SE, com duas mulheres em cada um.
É possível vislumbrar ao menos dois caminhos para melhorar tal situação: um de curto e outro de longo prazo. O de curto seria priorizar indicações femininas nos cargos ainda vagos. Tomemos como exemplo o TCM-SP. O órgão jamais teve uma mulher titular no seu corpo dirigente em seus mais de 50 anos de existência. Neste ano, o atual conselheiro Maurício Faria vai se aposentar, e compete ao chefe do Executivo, prefeito Ricardo Nunes (MDB), indicar um nome para a devida aprovação da Câmara Municipal paulistana. Ele poderia assumir a bandeira de mais espaço para as mulheres nas estruturas de poder.
Nomes excelentes ele possui ao seu redor na própria prefeitura, na academia, na Câmara e também em outros órgãos. Articulação no Legislativo para viabilizar tal indicação também.
Por fim, uma medida de longo prazo exigiria uma emenda constitucional e teria a ver não só com a necessária rediscussão dos critérios de seleção dos dirigentes dos TCs, incluindo a dimensão da representatividade de gênero, mas também com a busca de maior espaço para o recrutamento técnico, hoje limitado a 2 de 9 cargos no TCU e 2 de 7 nos demais tribunais —excluindo o TCM-SP, onde não há previsibilidade de recrutamento técnico. Todos os cinco conselheiros, e quiçá conselheiras, são de livre escolha do prefeito e do Legislativo local.
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Imagens aéreas das ondas no Cabo Branco mostram necessidade de se discutir engorda da praia

Recebi nesta semana um vídeo com imagens aéreas feitas por drone mostrando a dinâmica das ondas em horário de maré cheia (sem ressaca) na orla de João Pessoa. É assustador ver o quanto da faixa de areia foi consumido pelo avanço do mar e não é difícil prever a destruição que isso causará em um futuro próximo se não considerarmos alguma medida paliativa como a engorda. Morador de dois estados (Paraíba e Pernambuco) em épocas diferentes nos últimos 30 anos, lembro dos relatos dos meus pais sobre as ruas ‘engolidas’ pelo mar em Olinda e vejo risco de algo parecido já em alguns trechos da linda orla da capital paraibana.
O vídeo que tive acesso mostra as ondas se chocando violentamente contra as rochas que formam o enrocamento no sopé da Barreira do Cabo Branco, bem como no primeiro quilômetro na avenida ao norte da falésia. No caso da avenida do Cabo Branco, o que impede as ondas de baterem no outro lado da rua, em hotéis e restaurantes, é uma mistura de enrocamento e calçadas reforçadas não raro destruídas pela violência da água. Nestes quase 30 anos de convívio apaixonado por João Pessoa, vi a faixa de areia reduzir, a Praça de Iemanjá ser destruída e a barreira que protege o Farol, aparentemente, ser ‘sustentada’ por ele.
Ao longo de todo este tempo em que me dividi entre a Paraíba e meu estado natal (com tempo mais abundante por aqui), vi discussões nascerem e perecerem sobre a necessidade de engorda da faixa de areia da praia. Chegamos mais perto de ver isso concretizado na gestão do petista Luciano Cartaxo (2013-2020), o mesmo que por questões políticas se coloca contra, agora, à proposta do sucessor, Cícero Lucena (PP). Na época de Cartaxo, a necessidade foi apresentada em estudo, que apontou ainda necessidade de quebra-mares, intervenção no continente e enrocamento. Só as duas últimas medidas saíram do papel.
A discussão em relação à proposta de Cícero começou mal, com muitos detalhes dados sobre um projeto que ainda não existe, tampouco os estudos. Não demorou para que um mundo de fake news inundasse o debate. Um deles, talvez o mais risível, falava que a engorda criaria as condições para a construção de espigões na orla de João Pessoa. É preciso lembrar (ou dizer) aos desavisados que isso não é possível, porque a proibição está na Constituição do Estado da Paraíba, aprovada em 1989, e que norteou o Plano Diretor da capital. O limite de altura para a construção na orla é de 12,9 metros. Isso não mudaria com a engorda.
Outro fantasma é o dos impactos ambientais, um tema bastante sério e que, realmente, precisa vir a baila em qualquer projeto. Acontece que eles precisam ser apontados em estudo, para que se busque um mínimo de impacto. É bom lembrar que impacto zero é impossível. No Rio de Janeiro, na badalada praia de Copacabana, não parece, mas houve engorda há mais de 50 anos. Na época, a maré já ameaçava o histórico Copacabana Palace. Fui ler a respeito em pesquisas e encontrei gente falando de efeitos colaterais, mas eles não passavam de teorias em relação à granulação e à cor da areia. Houve também no Aterro do Flamengo.
Aqui mais perto, tivemos na praia de Piedade, em Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco. O avanço do mar lá já ameaçava os prédios na costa. Antes por lá só tinha calçada, água e tubarão. Agora, tem calçada, areia, água e tubarão. Este último, indesejado, já existia e permaneceu. Mais ao Norte de João Pessoa, vemos a situação de Baía da Traição. Lembro da faixa de areia antes da praça e de várias casas ao longo da avenida que tinham uma praia como quintal. Hoje resta apenas uma praça parcialmente destruída e muitas daquelas casas embaixo do mar.
Há inúmeros históricos de engordas bem-sucedidas pelo mundo e algumas nem tanto, como a de Balneário Camboriú. É a qualidade dos estudos prévios que eleva as chances de sucesso da obra. Precisamos primeiro reconhecer que o problema existe e que algum nível de impacto haverá para corrigir a destruição em curso. Se deverá ser feita a engorda ou não, só estes estudos poderão dizer. Para assegurar a qualidade deles, temos os órgãos ambientais constitucionalmente habilitados para isso e a vigilância da sociedade, orientada pelos especialistas da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
Muitas questões precisam ser respondidas: é preciso fazer a engorda? Se sim, em toda a orla ou em parte? Qual a melhor opção para se mitigar o avanço do mar? Quais serão os impactos ambientais? As respostas para estes e outros questionamentos vão orientar a busca por soluções. O que não dá é para ignorar que o problema existe, gostemos ou não do mandatário da vez no comando da cidade.
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Tribunal de Justiça e Assembleia empurram a Operação Calvário para a cruz

A Operação Calvário, desencadeada em dezembro de 2018, com o objetivo de investigar um grande esquema de desvio de recursos da saúde e da educação da Paraíba, por meio de contratos do governo com organizações sociais, está sofrendo novos solavancos. Corre risco.
Os problemas agora não são recursos protelatórios ou manobras jurídicas tentando empurrar as ações para a Justiça Eleitoral, como se desvios da ordem de mais de R$120 milhões fossem apenas um caso de caixa 2, nem o engavetamento que parte da investigação sofre no STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Como é do conhecimento geral, já são 10 as averbações de suspeição de magistrados para julgar as ações da Operação Calvário. Conforme a lei, por razões de foro íntimo, o juiz pode se averbar suspeito e, assim, ficar impedido de atuar no caso. Não precisam explicar os motivos.
Na semana passada, dois desembargadores – Márcio Murilo e Ricardo Vital, o relator da Calvário no âmbito do TJ (Tribunal de Justiça) – levantaram a questão em plenário. Como estivesse lidando com cristais, Murilo disse que as notícias sobre a suspeição de juízes estavam gerando “situações inconvenientes”. Direto, Vital afirmou que as averbações de suspeição haviam “instalado uma situação vergonhosa e vexatória” na Justiça. O primeiro, no entanto, transferiu o problema para a Assembleia, que demora a votar um projeto de criação de uma Vara Especial Criminal para julgar as ações de Orcrim (Organização Criminosa).
Por essa senda, flui o entendimento que as averbações de suspeição se dão em razão de os magistrados não disporem de estrutura para a condução de processos complexos e com grande quantidade de réus. Pode ser, mas existe suspeição sobre as suspeições. Além do mais, o TJ dispõe de instrumentos para resolver o problema com a designação de juízes especiais para o caso ou organizando grupos de magistrados para o trabalho em mutirão.
Do outro lado da rua, a Assembleia parece que resolveu complicar. É o que se pode depreender de pronunciamentos dos deputados Walber Virgulino (PL), Hervázio Bezerra (PSB) e George Morais (União), apoiados por Daniella da Vale (Republicanos) e Chió (Rede). Os parlamentares contestam os desembargadores e sustentam que a demora do Legislativo em criar a Vara Especial não é justificativa para a Justiça não julgar os casos da Operação Calvário.
Superficialmente, parecem ter razão. Mas por que, ainda ontem, os deputados se apressaram em votar um projeto do Tribunal de Justiça, enviado bem depois do pedido de criação da Vara Especial, regulamentando o pagamento de licença-prêmio aos magistrados? Por que estão sentados em cima do projeto que cria a vara para julgamento de Organizações Criminosas?
Como tudo gira em torno de suspeição, talvez não seja demais suspeitar que os deputados não tenham ânimo para aprovar a Vara Especial Criminal. Afinal, existem parlamentares denunciados na Operação Calvário e não são poucos os políticos que são acusados de envolvimento com organizações criminosas.
Pelo visto, na Paraíba, quem está condenada à cruz é a própria Operação Calvário.
Imagem de jcomp no Freepik
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O que Lula vai encontrar e fazer na Paraíba?

O que o presidente Lula vai encontrar e fazer na visita à Paraíba nesta quarta-feira?
Vai encontrar, pra começo de conversa, um ambiente politicamente desanuviado.
Diferentemente de todos os outros momentos, desde 2002, esta é a primeira visita sem disputa de palanque do PT com outros partidos, entre aliados, ou de aliados com o governador em exercício. Vide aí para os momentos em que Cássio Cunha Lima, Zé Maranhão e Ricardo Coutinho eram governadores ou estavam na oposição.
Com Ricardo derrotado e ausente, o presidente Lula pode se aproximar do governador João Azevedo e vai poder abraçar políticos das mais diversas forças partidárias, inclusive da oposição no estado, sem problemas. As notícias são de que até o prefeito Bruno Cunha Lima vai recepcionar o presidente em Campina Grande.
É momento para a Paraíba se envergonhar da pequenez do passado, não deixar se contaminar no presente e saber unir forças para construir um futuro mais promissor para o estado.
Mas o presidente Lula, em sua primeira visita à Paraíba no exercício do terceiro mandato, vem participar da inauguração de uma obra privada. A oposição radicalizada pode alegar esse detalhe para tentar desmerecer o ato.
A obra é privada, mas é importante. Trata-se de um complexo híbrido de produção de energia eólica e solar, composto de 15 parques com 136 aerogeradores, o primeiro com essas características no interior do estado (região de Santa Luzia). É um projeto de R$ 3 bilhões e que gerou 3,5 mil empregos diretos e indiretos na fase de implantação.
O complexo tem capacidade para produzir 471 MW (Megawatts) de energia limpa, o suficiente para atender uma cidade do porte de João Pessoa ou um pouco maior. O impacto econômico positivo para a Paraíba é inquestionável e, no geral, talvez justifique aproveitar para mostrar ao país a decisão de seu governo de abraçar o programa de mudança da matriz energética nacional, adotando de vez os projetos de energia limpa.
O presidente não vem inaugurar obras de governo nem estão previstos anúncios de programas ou obras governamentais, mas existe muito simbolismo no evento. É a sinalização de mudanças nos rumos do país, com a renovação de esperanças para o Nordeste.
Em relação especificamente à Paraíba, por exemplo, a visita de Lula pode valer esplendidamente para chamar a atenção para o que está acontecendo da Serra de Santa Luzia para baixo, uma região sem sonhos e que, de repente, está vivendo uma transformação extraordinária, que os paraibanos não conhecem nada ou quase nada.
O que Lula vai encontrar, então, no interior da Paraíba?
Simplesmente, 49 parques de energias renováveis já em operação, sendo 31 parques de energia eólica e 18 usinas de energia solar.
Vai encontrar mais 12 projetos em construção (7 de energia eólica e 5 de energia solar).
Vai saber que a Paraíba já tem 158 projetos de energia limpa outorgados/autorizados pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), sendo 82 parques de energia eólica e 76 usinas de energia solar). O governador João Azevedo relaciona 44 novos parques de energia eólica prestes a serem implantados e 53 de energia solar, projetos, certamente, passeando por instâncias governamentais responsáveis por financiamentos e aprovação.
Se fizer as contas direitinho, Lula vai ver que a Paraíba pode contar, em curto lapso de tempo, com 316 parques de energia eólica e solar, o que pode representar uma espécie de revolução para um sertão outrora condenado eternamente à pobreza.
Bem ali, nas portas do Sertão, estão instaladas grandes empresas da Espanha, França, Dinamarca, Portugal, Estados Unidos e do Brasil.
Lula vai ver e ficar sabendo que a Paraíba precisa de novas redes de transmissão para garantir o presente e o futuro dos negócios de produção de energia limpa.
São negócios que podem ajudar a mudar de forma significativa o Estado econômica e socialmente. Lógico que existem impactos ambientais a serem mensurados. Lógico que vai precisar de grandes projetos complementares para viabilizar o aproveitamento do que está sendo feito. E é isso que os políticos locais precisam se ocupar.
Não é pouco o que está acontecendo no interior da Paraíba.